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Nathalia Araújo·29 de novembro de 2017

Há um ano, a tragédia da Chapecoense devastava o futebol brasileiro

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Às 00h55 da madrugada do dia 29 de novembro de 2016, o avião CP-2933 da LaMia perdia o contato com a torre de comando do aeroporto de Rio Negro, na Colômbia. A primeira informação era de que o avião teria feito um pouso forçado em Medellín e a esperança era de que todos os passageiros estivessem bem.

Dentro da aeronave, estavam 68 passageiros e nove tripulantes. O destino do voo era o primeiro jogo da final da Copa Sul-Americana, no qual a Chapecoense enfrentaria o Atlético Nacional da Colômbia. O conto de fadas alviverde cativou o Brasil inteiro. A Chape, clube pequeno de cidade de Chapecó do Sul, em Santa Catarina, tinha a chance real de conquistar o seu primeiro título internacional.


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Entretanto, o jogo não aconteceu. O time não chegou ao seu destino final e o conto de fadas se transformou em uma triste tragédia. Não tardou muito, veio a notícia tão temida: o avião havia caído. O local, de difícil acesso, complicava a chegada das equipes de resgate. O mau tempo e o frio na região também não ajudavam. O cenário era caótico.

Enquanto isso, no Brasil, famílias e torcedores aguardavam por notícias. Ninguém queria acreditar no que estava acontecendo. Em Chapecó, muitos foram até a Arena Condá, estádio do clube, em busca de informações. A notícia que receberam era de que pelo menos 25 pessoas estavam mortas. A chama de esperança permaneceu acesa com relatos de que o lateral Alan Ruschel, o goleiro Danilo e uma comissária de bordo estavam vivos.

No Brasil inteiro, o assunto não podia ser outro. A caminho do trabalho, nas salas de aula, nas padarias ou nas bancas de jornais, a população brasileira não conseguia desgrudar das televisões, dos rádios ou das telas dos celulares em busca de boas notícias. Os questionamentos de “você viu o que aconteceu?” eram respondidos com leves acenos de cabeça e olhares vazios – mas, ao mesmo tempo, esperançosos.

Horas depois, entretanto, veio a confirmação de que apenas seis pessoas resistiram ao acidente: os jogadores Alan Ruschel, Jackson Follmann e Neto, o jornalista Rafael Henzel e os tripulantes Erwin Tumiri e Ximena Suarez. O goleiro Danilo, inicialmente resgatado, não resistiu aos ferimentos e faleceu. As buscas por sobreviventes foram encerradas. Ao todo, 71 pessoas – jogadores, jornalistas, dirigentes, comissão técnica, tripulantes e convidados – não sobreviveram à tragédia.

Agonia sem fim

Após o acidente em Medellín, os familiares tiveram que aguardar cinco dias até que os corpos das vítimas chegassem em Chapecó. E a espera só não foi maior graças à união e aos esforços das autoridades colombianas.

Os corpos chegaram no Brasil apenas no dia 03/12. Um velório coletivo foi organizado na Arena Condá e reuniu familiares, amigos, torcedores e personalidades do futebol como o técnico Tite e os ex-jogadores Seedorf e Puyol. Durante a cerimônia, chovia forte. Mas nem mesmo a água que caía do céu conseguia levar embora a tristeza que tomava conta do país.

Comoção mundial

A queda do avião da Chapecoense não causou comoção apenas no Brasil, mas também do mundo inteiro. Diversos times de diversos países homenagearam o clube seja com mensagens nas redes sociais, minutos de silêncio antes das partidas ou até mesmo estampando o escudo da Chape em seus uniformes.

Mas, sem dúvida, o ato mais comovente veio da Colômbia. No horário no qual seria realizada a partida, o Atlético Nacional organizou uma linda homenagem aos que perderam suas vidas na tragédia. O povo colombiano lotou o estádio e também as ruas ao redor do local no qual aconteceria o jogo.

Ao mesmo tempo, a Arena Condá também recebia os torcedores da Chapecoense que se reuniram no estádio, não só como forma de fazer um tributo, mas também de buscar consolo para um momento extremamente difícil.

Na semana seguinte, mais homenagens no Couto Pereira. O estádio do Coritiba estava reservado para receber o jogo da volta. Milhares de torcedores de diferentes times se uniram para criar uma atmosfera inexplicável. Nas arquibancadas, sinalizadores e gritos de “é campeão”.

No Maracanã, os cariocas se reuniram em um momento de solidariedade. Deram voltas no estádio com cantos de “vamos, vamos Chape” e, ao final, fizeram uma oração em homenagem aos que faleceram na tragédia.

A mãe do goleiro Danilo, Dona Ilaídes, se tornou símbolo de força em meio a tanta tristeza. Mesmo vivendo sua tragédia pessoal, teve um coração enorme ao pedir um abraço “em nome da imprensa” ao repórter Guido Nunes e protagonizar uma das cenas mais emocionantes após a tragédia.

O que aconteceu no último ano?

O plano de voo que nunca deveria ser aprovado

O planejamento realizado pela LaMia previa um tempo de viagem igual ao tempo de autonomia da aeronave: quatro horas e vinte e dois minutos. O correto é o avião possuir um tempo de autonomia maior que o de viagem, exatamente para que o piloto e a tripulação possam lidar com qualquer tipo de imprevisto.

As investigações realizadas em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia (local de onde saiu o voo), apontaram cinco responsáveis:

• Célia Castedo – funcionária da AASANA, empresa que administra a navegação aérea na Bolívia.

• Joons Teodovic – supervisor de tráfego aéreo da AASANA (estava de plantão na noite do acidente)

• Gustavo Vargas Gamboa – diretor geral da LaMia

• Gustavo Villegas – funcionário de aviação civil da Bolívia e filho de Gamboa

• Marco Rocha – um dos donos da LaMia

Gustavo Gamboa está em prisão domiciliar. Seu filho, Gustavo Villegas, é acusado de usar sua posição no país para favorecer as operações da LaMia na Bolívia. Teodovic também está em prisão domiciliar. Para os investigadores, ele teria autonomia para impedir a decolagem da aeronave.

Célia Castedo pediu refúgio no Brasil e está em Corumbá, no Mato Grosso do Sul. Ela é acusada de não reportar a tempo as observações do plano de voo da LaMia. Marco Rocha está foragido.

O Ministério Público Federal de Santa Catarina suspeita do envolvimento de mais uma pessoa: Ricardo Albacete. Documentos apontam que ele pode ser o verdadeiro dono da LaMia, mas ainda não é investigado.

Outros inspetores de aviação que poderiam ter evitado a decolagem do avião também não foram responsabilizados. O Ministério Público da Bolívia tem até junho de 2018 para concluir as investigações e apresentar as denúncias.

Pelo lado da Chapecoense, o clube não foi encarregado de culpa. O MPF não identificou qualquer conduta negligente ou imprudente por parte dos dirigentes do clube.

Indenização às famílias

100 dias após o acidente, as famílias dos jogadores da Chapecoense receberam o seguro de vida da CBF (12 salários mínimos) e o seguro de vida do clube correspondente a 28 salários. Já os parentes de outros funcionários do time receberam apenas o amparo financeiro por parte da Chape.

Além dos seguros, a Chapecoense arrecadou cerca de R$43.784,71 para cada famílias. Ainda assim, muitas ainda passam por dificuldades financeiras, já que as vítimas eram os provedores de dinheiro da casa.

Em novembro deste ano, o clube firmou uma parceria com a Associação Brasileira da Vítimas do Acidente com a Chapecoense (ABRAVIC) para disponibilizar R$28,8 mil por mês aos associados.

Em relação à indenização por parte da LaMia, nada foi resolvido. A seguradora da empresa, Bisa Seguros e Resseguros SA, alega que apólice com a companhia aérea não tinha mais validade na época do acidente.

Um pagamento no valor de $200 mil, que sairia de Fundo de Assistência Humanitária, foi proposto, mas o acordo não foi aceito. Dessa forma, discussões judiciais ainda vão ocorrer no futuro.

Reconstrução do time

A Chapecoense se recusou a aceitar a proposta de ficar livre do rebaixamento no Campeonato Brasileiro por três anos e começou a reconstrução do seu elenco. Muitas das promessas feitas na época do acidente não foram cumpridas e poucos times colaboraram emprestando ou vendendo jogadores.

O técnico Vágner Mancini (hoje no Vitória) foi o responsável por conduzir o projeto de renovação do time. Com a equipe, Mancini conquistou conquistou o Campeonato Catarinense contra o Avaí, mas não resistiu até o final da temporada.

Pela Libertadores, a Chapecoense foi eliminada ainda na fase de grupos, após escalar de forma irregular o zagueiro Luiz Otávio e ser punida com a perda de três pontos. Pela Sul-Americana, o time foi eliminado nas oitavas de final, após perder o jogo de volta por 4×0 contra o Flamengo.

Entretanto, a grande redenção do time veio no dia 16 de novembro, quando, de virada, a Chapecoense venceu o Vitória por 2×1 e garantiu a permanência na Série A. No vestiário, após a partida, os jogadores explodiram com o grito que ficou eternizado no futebol brasileiro: “vamos, vamos, Chape!”

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Os sobreviventes

Alan Ruschel

Ruschel foi o primeiro a ser resgatado. Sofreu compressão na tíbia e no abdômen, e fratura da vértebra 10. Dos três jogadores sobreviventes, foi o primeiro a voltar aos gramados, no dia 7 de agosto durante a partida amistosa contra o Barcelona.

Cerca de um mês depois, Alan Ruschel marcou o seu primeiro gol após o retorno na derrota por 4×1 para a Roma em jogo amistoso. Voltou a aparecer em uma partida oficial no dia 14 de setembro, contra o Flamengo pela Copa Sul-Americana.

Jakson Follmann

Por causa do acidente, Follmann perdeu parte da perna direita e teve que se aposentar do futebol. O ex-goleiro trabalha como comentarista na Fox Sports. Em entrevista, ele já confirmou a possibilidade de se tornar atleta paralímpico.

No dia 20 de outubro, Follmann se casou com Andressa Perkovski, em uma cerimônia que foi marcada por muita emoção. Inicialmente, o casal subiria ao altar no dia 16 de dezembro do ano passado, mas os planos tiveram que ser adiados. Quase um ano depois, a cerimônia só foi possível graças a doações de empresas e amigos.

Neto

Helio Hermito Zampier, mais conhecido como Neto, foi o último sobrevivente a ser resgatado. O jogador foi encontrado sob as ferragens, quando os socorristas já acreditavam ter removido todos os corpos.

Neto sofreu diversas fraturas expostas e foi internado sob cuidados intensivos em um hospital local, onde permanece em coma induzido e sob respitação artificial.

Operou pulmão, joelho, pulso e crânio e, mesmo com estado de saúde complicado, Neto se recuperou e retornou ao clube. Apesar de ainda não está pronto para retornar aos gramados, o zagueiro treina e sonha com a sua reestreia.

Rafael Henzel

Dos 21 jornalistas que viajaram com a equipe da Chapecoense, Rafael Henzel foi o único sobrevivente. O narrador da Rádio Oeste Capital FM participa de um programa matinal e continua a cobrir as partidas do clube.

Henzel teve hemorragia pulmonar e fratura de várias costelas. Passou por cirurgia, ficou sob respiração artificial para se recuperar e, depois, ainda sofreu pneumonia. Em junho desse ano, ele lançou um livro contando sua experiência.

O jornalista de 43 anos sobreviveu graças ao fato de ter trocado de assento quatro vezes durante o voo – em parte, por cause de Lionel Messi. Henzel iria se sentar no corredor da penúltima fila, mas um membro da imprensa pediu para ocupar aquele lugar para ficar onde o atacante argentino sentara algumas semanas antes.

Ximena Suárez

Ximena fraturou a tíbia, a fíbula e também o raio e a ulna. Além disso, a ex-comissária de bordo sofre constantemente com as consequências psicológicas da tragédia. No braço direito, ela fez uma tatuagem do avião da LaMia decolando, um tributo aos amigos que se foram. Ela retomou a carreira de modelo com a ajuda da Megamodels de Megatlon em Santa Cruz, na Bolívia.

Erwin Tumiri

Pouco se sabe sobre Erwin. Depois do acidente, ele e Ximena saíram dos escombros e se afastaram por medo de uma explosão. O mecânico de aeronaves foi o primeiro a receber alta. Ao retornar para a Bolívia, foi hospitalizado para permanecer sob observação ao apresentar um ligeiro edema cerebral.

Sua última aparição pública foi em abril do ano passado, em um programa de TV, no qual falou sobre o acidente.